Eletrificar o transporte público é opção para ajudar a reduzir desigualdades

A mobilidade elétrica pode ajudar a reduzir a desigualdade social na América Latina, tornando as cidades mais inclusivas. Pelo menos essa é a conclusão a que chegaram os participantes do painel “Boas práticas para a eletrificação de ônibus na América Latina”, realizado pela PNME (Plataforma Nacional de Mobilidade Elétrica) e o C40 Cities, no dia 10 de novembro, no espaço reservado para o Brazil Climate Action Hub, durante a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), em Glasgow (Escócia).

O encontro trouxe exemplos da Cidade do México, de Bogotá, de Guadalajara e das cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, com representantes destas localidades. Para o coordenador executivo da PNME, Marcus Regis – que moderou o painel -, a mensagem principal deixada durante o encontro é a de que “apesar das dificuldades que países como os nossos enfrentam, as coisas estão acontecendo”. “Estamos seguindo em frente”, acrescenta.

De fato, os desafios da região são muitos, mas não impossíveis de serem superados. Bogotá, por exemplo, falhou 16 vezes até chegar no modelo atual, segundo Felipe Ramírez, CEO do TransMilenio (sistema de BRT local). “Trabalhamos de forma acelerada no modelo de negócio, não foi fácil estruturá-lo. Falhamos muitas vezes. Levamos seis anos começando, tentando, aprendendo e, finalmente, tivemos sucesso”, afirma. Atualmente, a capital colombiana lidera a eletrificação de ônibus na região, com uma frota de 483 ônibus elétricos e a estimativa de que mais 1,2 mil entrem em operação em 2022.

São Paulo, por exemplo, prevê zerar as emissões de dióxido de carbono (CO²) na frota de ônibus da cidade até 2038, além de incluir no sistema 2,6 mil ônibus elétricos a bateria até 2024, como comentou o assessor especial para Sustentabilidade da Secretaria Municipal de Relações Internacionais, Francisco Castro. “O nosso objetivo é bastante ambicioso e, para uma cidade como São Paulo, precisamos ter essa visão”, afirma Castro, acrescentando que o Plano de Ação Climática da capital paulista foi desenvolvido ao longo de dois anos, com o apoio do governo britânico e do C40 Cities.

“Estamos agora analisando os modelos de negócio para ver como podemos aplicar isso. Temos algumas opções, como o arrendamento completo de ônibus, utilizando empresas de soluções energéticas que vão fornecer o serviço em sua totalidade, ou instituições internacionais de financiamento que possam nos apoiar. E ainda tivemos um projeto-piloto que foi muito bem-sucedido, com 17 ônibus elétricos, e agora temos certeza de que vamos poder fazer isso funcionar.”

O tipo de financiamento é uma das questões cruciais para a implementação da frota elétrica na América Latina. Segundo o secretário municipal de Governo e Integridade Pública do Rio de Janeiro, Marcelo Calero, é necessária uma gestão clara e transparente por parte do poder público para garantir a saúde financeira do modelo adotado. “Um pressuposto básico é que, em havendo transparência, conseguiremos chegar de maneira mais rápida e efetiva em algo que seja sustentável do ponto de vista sobretudo financeiro”, completa.

Eletrificação e redução da desigualdade

Outro ponto discutido no painel foi como a eletrificação dos ônibus nas cidades latino-mericanas pode promover uma sociedade mais justa e economicamente dinâmica. A região metropolitana de Guadalajara, no México, implementou 38 ônibus elétricos também com o apoio técnico do C40. Para isso, foram estudados alguns passos importantes como: entender o tamanho da frota real, a situação em que se encontravam os veículos em operação e a demanda de circulação de pessoas, explica Martha Martínez, da Coordenação Estratégica de Gestão Territorial do Estado de Jalisco.

Definidos esses pontos, os ônibus eletrificados foram destacados para uma parte da região metropolitana em que predomina uma população socialmente carente. “O projeto superou nossas expectativas. Hoje temos quatro vezes mais passageiros, com menos de um ano de operação. Isto significa que o custo de operação se paga com a própria bilhetagem. Acreditamos que isso esteja associado a um planejamento mais preciso sobre a conexão das viagens. E, para nós, é muito importante que a implementação de um projeto como este tenha como tema transversal a questão da inclusão”, conta Martha.

Para o secretário Marcelo Calero, democratizar o transporte também envolve “democratizar o espaço, o território”. “Quando tratamos de eletrificar o sistema de transporte, estamos falando na verdade da sustentabilidade desse sistema a longo prazo. Apesar de o custo de implementação do transporte elétrico ser mais alto, a operação é mais barata, especialmente num país como o Brasil. Na medida em que cuidarmos bem do nosso sistema elétrico, garantindo que a matriz brasileira de energia continue limpa, estamos falando de um sistema que potencialmente vai ficar mais barato, mais em conta.”

Já na região metropolitana da Cidade do México, uma forma de reduzir a desigualdade social por meio do transporte foi a implantação de teleféricos, que ajudaram a cortar distâncias para quem vive em áreas mais afastadas do centro. “É uma forma de atingir a inclusão social. A maioria das nossas cidades têm áreas semelhantes, em que as pessoas precisam subir o morro para chegar em casa”, afirma Roberto Capuano, diretor geral do Metrobús (sistema de BRT local).

“Quando você pensa na mobilidade como sendo algo que você tem que descer a montanha por meia hora para tomar um ônibus pavoroso, que vai levar você até o metrô que está a uma hora de distância, isso é excludente. O teleférico nos permite conectar áreas importantes da cidade. A mobilidade elétrica, não só em ônibus, mas em geral, vai permitir que a gente encontre meios de incluir as pessoas socialmente”, completa.

O secretário Francisco Castro resume o debate concluindo que a eletrificação de ônibus “vai aumentar a qualidade de vida do cidadão e dos trabalhadores”, além de “reduzir a poluição sonora e do ar”. “Acredito que os custos operacionais serão mais baratos e poderemos pensar também numa redução dos gastos públicos no futuro, para redirecioná-los para saúde e habitação.”

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